A Nossa Madrasta Língua Portuguesa
Introito:
O nosso idioma é uma composição de fantásticas armadilhas, quer seja na ortografia ou mesmo na oralidade. E é na oralidade “que o bicho pega feio”! Temos o grave defeito de, ao falarmos, trocar o som da vogal “O” pela semivogal “U”. “O uso do cachimbo põe a boca torta!”, já dizia o adágio popular que vem, como uma luva, se encaixar ao tema em epígrafe!
A maioria dos usuários do nosso idioma nunca diz “Leite” – diz “leiti”! Os nordestinos e os sulinos fazem parte de uma minoria que pronuncia o substantivo leitE, dando-lhe uma conotação de oralidade até – de certa forma – engraçada para quem ouve! Por estarmos acostumados ao som da semivogal “I”, estranhamos ao ouvirmos a vogal “E” – corretamente usada, diga-se – na pronúncia do saboroso leitinho nosso de cada dia!
Deve-se fazer uma observação: A cacofonia pode constituir-se em um dos chamados vícios de linguagem, e devem ser evitados, tanto na linguagem coloquial (oralidade) ou mesmo na escrita. E acontece quando uma palavra ou sílaba – em união com outras – formam expressões com sons desagradáveis ou ambíguas, com duplo significado, normalmente termos de baixo calão.
Ouso pedir aos que vierem a honrar-me com a leitura deste texto, uma especial atenção para este vício de linguagem (a cacofonia) por ser ele, o vício, de fundamental importância para o entendimento do enunciado! Obrigado!
O Safari Tupiniquim:
Toda esta divagação tem sentido. Quero contar a história de um “Safari Tupiniquim” realizado por um grupo de três amigos que exerciam profissões distintas. Um era Mecânico, o outro era Médico e terceiro um ator Cômico.
Vamos ao caso, não sem antes pedirmos aos que me leem que atentem para o detalhe da oralidade na troca da vogal “O” pela semivogal “U”. É de suma importância! Sigamos, pois, em frente:
E lá estavam eles – componentes do Safari Tupiniquim – vestidos a caráter e embrenhados pela densa floresta. Em dado momento, eles se deparam com um índio que – com cara de mau e armado com arco e flecha – os encara. O medo toma conta do “valente” grupo. Nestes casos, fazer o quê? Lutar? Nem pensar! E correr?... Idem: – nem pensar!
-Amigos, vamos tentar o diálogo! – dissera o mecânico! Vou tentar bater um papo com o guerreiro. Corajosamente, retira da garganta um imaginário pigarro e – na maior cara de pau – se apresenta para o Índio Cara de Mau!
- Chefe valente cacique (Puxou o saco do índio, né?), mim ser Mecânico! E com a intenção de ser mais explícito, repetiu – dividindo as sílabas que compunham a formação do nome da sua profissão – Me... Câ... Ni...CO de índio e de homem branco também! – dissera dando ênfase à sílaba final!
O irritado guerreiro índio se inquieta! Dá um passo à retaguarda, franze a já enrugada testa, coçou uma imaginária caspa na densa cabeleira e assestou um olhar de poucos amigos para o trêfego mecânico!
O Médico – aproveitando o embalo e a deixa – se apresenta:
-Valente guerreiro (O saco do índio já devia estar doendo pelo fato de ter sido tão puxado!) e bravíssimo cacique, mim ser Médico. E procurando imitar a apresentação feita pelo amigo Mecânico, repetiu o nome da sua profissão, tendo, também, o devido cuidado de separar – em alto e bom som – as sílabas que compunham o nome da sua profissão: Mim sê médico – e repete: Mé... Di... CO de índio e de homem branco, também! – dissera dando ênfase à sílaba final!
O índio refrangiu a já frangida cara, arregalou os olhos, deu um passo à retaguarda e ficou estático sem dar, sequer, uma ínfima piscadela. Por certo imaginando o pior para si!
O Cômico não deixou por menos e se apresentou para o assustado índio:
-Nobre e valente cacique (Tadinho do saco do índio! Os bagos já não suportavam tanto sofrer.) mim sê o Cômico deste grupo de amigos. Assim dizendo – e como os demais – se pronunciou dizendo a sua profissão de modo bem enfático, dividindo as sílabas: Mim sê Cô... Mi... CO de índio e de ....
O índio, coitado – mesmo tendo o saco dolorido por tantos puxões recebidos – ao ouvir o que fora dito (Precisa dizer que ele estava apavorado? Precisa e digo que sim!) se escafedeu em desabalada correria pela mata sem dar, sequer, nem sinal de vida! Por certo pela sua cabeça estava passando o triste e medroso pensamento:
-“Cara pálida doido querer CôMiCO de índio?” Socorro Tupã!
Moral da imoral história:
Se, às vezes, os fins justificam os meios, esta é uma das poucas vezes em que um cacófato salvou um safari!
Imagem: Google