EGOCENTRISMO
No coletivo urbano estávamos como se sardinhas fôssemos: enlatados e espremidos! O óleo onde geralmente conservam-se o pescado era – no nosso caso – o suor oriundo de fedorentas e suadas axilas.
Éramos pessoas enlatadas, espremidas não somente pela fuselagem do veículo que nos conduzia. Estávamos presos, acorrentados aos nossos problemas cotidianos. Somos pessoas que moram na mesma cidade, bairro, rua e – na maioria das vezes, pasmem – no mesmo condomínio, mesmo bloco, mesmo andar. E mesmo sendo “conhecidos de vista”, não nos conhecíamos. Vivíamos e convivíamos numa mesma mesmice de um egocentrismo gritante a corroer as nossas mentes, entranhas e almas. E o motivo maior era a falta de comunicação entre as pessoas. Por sentirmos medo (Hoje, teme-se tudo e a todos.) receamos sorrir, conversar, olhar e – o que é pior – amar! Sim, temos temor de amar. O temor em dar um sorriso, entabular uma conversação, dirigir um olhar, expressar o sentimento maior ao dizer eu te amo, se faz latente em todos nós. O “eu te amo”, hoje, tornou-se sinônimo de uma vulgar cantada. Que mal (E aqui estou lançando aos quatro ventos a pergunta.) existe em uma mulher dizer para uma amiga: eu te amo! Que mal existe em um homem dizer para um amigo: eu te amo! Dos quatro ventos ouvidos veio a resposta: não há mal algum – nenhum! Mas, e mesmo assim, o medo perdura.
Se não existe o mal ao se propagar esse nobre sentimento do amor pelo próximo, por que não difundi-lo pelo mundo? O que está havendo com a humanidade? Será que a exacerbada violência tem o poder de sufocar a magnânima força do amor? Se assim for, direi: - O tamanho da bota (medo) do opressor tem a exata dimensão da covardia do oprimido. E quanto maior for a omissão em se opor à opressão, a bota estará sempre crescendo, oprimindo e esmagando o mais belo de todos os sentimentos: o amor! E quando o amor morrer, nada mais restará do homem – medroso homem, medrosa humanidade!
Assim sendo, incito-os, pois, a gritar para o mundo o real amor que sentem por alguém, sem se importar que esse alguém seja oposto ou do mesmo sexo. O verdadeiro amor é aquele que une dois, ou mais, seres, e não aquele que une, tão somente, dois corpos pelo gênero no momento de satisfazer aos instintos do prazer carnal. Hoje o eu te amo significa: quero transar com você. E por ter essa conotação – esdrúxula, diga-se – o sentimento perdeu o verdadeiro sentido que há no verbo amar. E o mais belo de todos os verbos se vulgarizou e estiolou-se dos pétreos corações, levando os homens a um enorme medo de conjugá-lo na primeira pessoa do presente do indicativo: Eu te amo!
O próprio Cristo pregou: -“Amai-vos uns aos outros, como Eu vos amei!” E – com toda a vênia – acrescento: - Sem preconceito ou medo de ser feliz, Senhor!
Se uma mulher atrever-se a dizer para uma amiga o “eu te amo”, os idiotas da objetividade dirão: - Aquela é “uma lésbica, tremenda sapatão”! Pobres parvos, idiotas da objetividade por não terem a coragem de dizer o eu te amo!
Se um homem tiver a coragem e bravura de dizer para um amigo o “eu te amo”, os idiotas, rindo, dirão: - Aquele ali, está explicado, é uma baita bichona que acabou de “sair do armário!” Sem comentários por não merecê-los!
Santo Deus! Se, assim, pensam os homens, para onde caminha a humanidade? Por que o medo de comunicar-se usando, para esse mister, o sorriso, a fala, o olhar e o amor?
Estamos de volta ao coletivo que nos transporta. E nele vejo circunspectas figuras de humanas aparências e animalescos sentimentos. E esses zumbis estão fechados nos seus egocentrismos – peculiar dos medrosos – que lhes corroem o coração, levando-os a se esconder sob a capa de um machismo – às vezes duvidoso – que os levam a dizer que “homem que é macho, não chora”! Concordo! Homem não chora e nem deve chorar! O choro é algo típico de seres humanos. E isso, nem todos os homens são.
O ônibus segue o seu destino! Nele estamos a seguir, também, o nosso! Ao nosso lado estão pessoas que moram na mesma rua, bairro e condomínio.
Contudo, com elas não falamos. Descemos no mesmo ponto de desembarque e continuamos com o nosso mutismo. Andamos, lado a lado, até os nossos lares, subimos os mesmos degraus da escada, tomamos o mesmo elevador sem, contudo, dizermos um oi, um bom dia ou boa noite. Não lançamos, sequer, um olhar. Adentramos apartamentos diferentes. Fechamos as nossas portas e corações para nos trancafiarmos no nosso egocentrismo crônico.
A esposa nos cumprimenta com um: boa noite, querido! A ela, contudo, respondemos com um seco e inexpressivo: - Boa noite! Nos “esquecemos” de adoçar essas palavras com uma frase de amor, que seria: - Boa noite, querida! E, adocicando-a ainda mais, poderíamos dizer: - Eu te amo tanto! Mas, por que dizer e propalar esse sentimento? Ela já é a “minha mulher”, ou: ele já é o “meu marido!” Ledo engano. Os casais detêm a “posse” um do outro, sem, todavia, deterem a “propriedade”, ser “o dono do outro” ou “da outra”.
Posse difere de propriedade. Na posse você detém ‘o dever de cuidar’ e, no caso dos casais, este dever de cuidar está – acima de tudo – no amarem-se acima de tudo e, sem medo, propagar aos quatro ventos: - Eu te amo, meu amor!
E o perigo da morte do amor entre marido e mulher, está – justamente – nesse sentimento de “propriedade” entre os seres humanos. Ela não é, somente, a “sua mulher”. Ela é – e deverá sempre ser – a sua esposa, sua amada, sua companheira o seu amor. Ela deve ser na cama, a sua meretriz, uma puta! Todavia, para a sociedade – uma dama! Mulher, simplesmente mulher, existe em qualquer esquina. O seu amor, a sua esposa, contudo, somente deve existir no seu lar, aconchegada no seu coração.
Ele não é, somente, o “seu homem”. Ele é – e deverá sempre ser – seu esposo, seu amado, seu companheiro, seu amante e seu amor. Deve ser o seu gigolô na cama, contudo, para a sociedade, um gentleman, um Don Quixote de espada, sempre em riste, para defender a sua Dulcineia! Homem, simplesmente homem, existe em qualquer esquina. O seu amor, o seu esposo, contudo, somente deve existir guardadinho no seu coração.
Homens, mulheres, existem em todos os lugares. Seres humanos são, na atual conjuntura, raríssimos de serem encontrados. Se tiver a sorte de encontrá-lo, não hesite: ame-o com todas as forças do seu coração.
Demonstre esse nobre sentimento sem o medo de ser feliz, porque somente será feliz aquele que ama e não teme propagar ao mundo esse amor. Sem se importar com o que possam dizer ou vierem a pensar, sinta e propague esse amor que – independente do gênero, cor ou religião – está dentro de você. Então, possuído por este sentimento maravilhoso, grite para o mundo, com toda a força do seu coração liberto de preconceitos egocêntricos:
-Eu te amo!
Adoro ver duas mulheres se amando, se beijando nas praças, nas ruas e jardins. Adoro ver dois homens se amando, se beijando nas praças, ruas e jardins. Melhor vê-los se amando ao invés de assisti-los digladiando.
Homens, mulheres não sejam egocêntricos. Independente do gênero, mesmo porque, o amor não está restrito ao gênero, amem-se e propaguem este amor para que todo mundo possa ouvi-los dizer:
-Eu te amo!
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