*A DOR DA DESPEDIDA*
Estava assentado em uma confortável poltrona da sala vip do Terminal Rodoviário do Tietê. Ao meu lado, a minha bagagem. Ao meu colo, o meu agasalho. Em minhas mãos tenho uma revista – cortesia da empresa que me transportaria. À minha frente, um enorme televisor distraía aqueles que, como eu, aguardavam a hora e vez do embarque. A revista era, aleatoriamente, folheada. Deixarei para ler dentro do ônibus – pensei! Em dado momento, pelo serviço de som, uma voz feminina invade o recinto. E ela anunciava:
-Atenção, senhores passageiros com destino a Belo Horizonte, no horário [...].
Era o meu horário. Sobracei bagagem, agasalho, revista e me dirigi à plataforma de embarque. Embarquei e ocupei a poltrona de número 13, temida por crédulos em crendices populares, adorada por mim que amo ter uma boa visão da paisagem estática, vista, em movimento, pelos passantes.
Os ocupantes das demais poltronas ocupam-nas, tendo os devidos cuidados em colocar nos guarda-volumes as pequenas bolsas e valises. A poltrona ao meu lado – até então vaga – é ocupada. Nela assenta-se uma jovem, parecidíssima com uma famosa atriz Global: Mariana Ximenes. De soslaio, olho-a. Notei que trazia uma enorme tristeza estampada no rosto e olhar. E o seu olhar passeava, ávido, pela plataforma na busca dos olhos do amado que lá ficara. Encontra-o. Um pálido arremedo de sorriso aflora-lhe o rosto. Ainda de soslaio a vejo transmitir ao amado as suas últimas palavras de despedida. E as palavras deveriam ser traduzidas sob a forma de leitura labial. O ônibus não possui janelas que possam se abrir. No espaço a elas destinado há grossos vidros. Isso é uma maldade para com aqueles que amam e que gostariam de tocar as mãos dos entes queridos ao se despedirem – pensei! Curioso, fiquei fazendo a leitura labial dela e do seu amado através do reflexo da imagem por ela projetada pelo grosso vidro que os separavam. E ela dizia:
-“Eu te amo muito! Eu já estou com saudades de você!”
Do lado de fora o amado, fazendo a tradução, respondia dando ênfase à forma labial de comunicação:
-“Eu também te amo muito, querida! Volte logo!”
O ônibus parte levando saudades, saudades deixando. As pálpebras da moça, ao meu lado, estão carregadas de lágrimas. E já não são mais pálpebras, eram diques prestes a se romperem. Os músculos faciais tentam conter o desastre – impossível! Se fossem feitos de titânio, talvez, conseguiriam o intento. Mesmo assim, tinha as minhas dúvidas. E as dúvidas se fazem presentes: os diques se rompem. As lágrimas, até então contidas, são empurradas pela força da saudade e cascateiam rosto abaixo, abrindo um desfiladeiro no lindo rosto. Ela, usando o dorso da mão, enxuga o rosto e olha para mim. O seu rosto traz um meigo e vergonhoso sorriso como a pedir-me desculpas. Não era preciso. Somente os parvos, os idiotas da objetividade, não entenderiam a força de uma lágrima de amor. Retribui o sorriso, ofereci-lhe um lenço e entabulei uma conversação. Queria de certa forma, distraí-la e tornar o seu tormento mais ameno!
-Oi! Temos uma longa viagem pela frente, permita-me, pois, apresentar-me? Disse-lhe o meu nome e o que fazia e, dentre os meus afazeres, estava o gostar de escrever – mesmo não sabendo, diga-se!
Ela, por sua vez, disse-me o seu nome e motivo da sua viagem: ministraria um curso para os funcionários da empresa na qual trabalha. Disse-me, ainda, ser casada e que estava sofrendo muito com aquela abrupta separação. A mim pareceu ser aquela a primeira vez na qual se separava do amado esposo. Torci para que não fosse e explico: Se ela estava tão saudosista e se não fosse aquela, a primeira vez que se separavam, deveria existir entre ambos um enorme e imensurável amor – coisa raríssima nos atuais tempos!
Quis saber e perguntei:
-Você conhece Belo Horizonte?
-Não! Essa é a primeira vez em que viajo para Minas Gerais.
-Belo Horizonte é uma bonita cidade. Se quiser um belo horizonte ver, venha a Belo Horizonte conhecer – brinquei! Brinquei e ela riu. Ao ressorrir mostrou-me um riso que nada tinha de amarelo. No seu peito, creio, as saudades do amado eram latentes. Contudo, ela já demonstrava uma certa compreensão em aceitar os fatos como eles são. Sabia que a dura batalha pela subsistência, às vezes, é cruel: separando pais de filhos e os amantes – como a Renata Finoti (É esse o nome do meu personagem!) – do seu amado esposo.
A nossa viagem transcorreu tranquila. Durante o transcurso falamos de todos os assuntos possíveis e imaginários – Renata demonstrou ser muito culta! E quando uma viagem é agradável, o tempo voa – mesmo estando em um ônibus. E o tempo, passou célere. O ‘airbus taxiou’ na pista da plataforma de desembarque. Ajudo-a com a sua bagagem e levo-a até o ponto de táxi. Nos despedimos, não sem antes orientá-la como chegar ao endereço desejado.
Adentro um táxi que me levaria para casa. Há no meu rosto um sorriso. Estava feliz por ter conhecido alguém que, em princípio, estava triste e agora parecia mais tranquila. Feliz não estava – bem sei – conformada, talvez! E ela torcia, imagino, para que o tempo voasse bem mais ligeiro, pois, somente assim estaria, em breve, nos braços do seu amado!