FELIZ DIA DAS MÃES
Introito:
Estou a tomar o meu café da manhã. A televisão ligada me informa das últimas, porém, as já, velhas notícias dos atos de corrupção que assolam o Brasil. Enfim, entram os comerciais. Um deles anuncia um ferro de passar roupas. Algo maravilhoso por ser de última geração que – com o decorrer dos tempos, e nem tantos tempos assim – amanhã já estará ultrapassado. É a tecnologia – louca; desenfreada; consumista e vulgar – a nos enfiar goela abaixo, e a todo instante, um amontoado de ‘produtos de última geração’ que dura um átimo de segundo de uma tontíssima geração de desenfreados e tolos consumistas.
Este anúncio faz-me embarcar nas Asas das Minhas Elucubrações. (Quando saudoso estou, sempre faço isso!) E elas me levam à minha infância. Sou menino! Tenho quatro anos – cinco, se tantos. Estava abraçado às pernas da minha mamãe e sentindo pena – um tremendo dó – por ver o seu sofrimento na sua lide incansável de lavar, passar no passar do dia a dia. O seu rosto estava rosado pelo calor oriundo do ferro de passar. Ele, indiferente, pedia a todo instante que fosse assoprado para manter-se aceso na geração do essencial calor para produzir um bom trabalho – o trabalho de passar! Esse assopro junto ao ferro – e o calor do mesmo junto à face da mamãe – eram os responsáveis pela rósea coloração da tez do seu cansado e suado rosto.
O tapicuru é uma árvore de resistência ímpar. Quando queimado, produz um carvão de excelente qualidade na geração de energia calórica. E era essa a energia que mamãe usava para passar as roupas. Eram peças de cama, mesa e banho que, lavadas às margens do Rio Todos os Santos, geravam a mínima fonte de subsistência da nossa paupérrima família. Ela, minha mamãe, era uma exímia lavadeira.
Capítulo I:
O carvão oriundo do tapicuru estava ardendo dentro do ferro de passar roupas. Havia, todavia, uma geringonça, feita de madeira, por marceneiros, que amenizava o sofrimento das lavadeiras – operárias do Rio Todos os Santos. A geringonça era uma peça com 0,80m de altura com uma forma quadrada de 0,15m. Era um caixote fechado no fundo. No seu interior, havia um eixo fixado em uma tábua, com dimensões um pouco menores que as do interior do caixote, o que facilitava o seu vai-e-vem dentro da caixa. Nela, havia afixado um pedaço de cabo de vassoura. Na outra extremidade, uma tampa fechava o caixote, tendo, no seu centro, um orifício por onde o antigo cabo de vassoura era acionado. E ele subia e descia passando célere em um vai-e-vem constante, produzindo o assopro tão necessário para manter bem acesas as incandescentes brasas do tapicuru. Sintetizando – a geringonça era aquilo que, hoje, podemos ver como sendo uma bomba de encher pneus de autos, de bicicletas, bem como, as bolas de futebol. E esta ‘bomba geringonça’ fazia acender as brasas, ascendendo à temperatura do ferro de passar, sem, contudo, rosear e fazer suar o rosto das lavadeiras. Era “um luxo de dar gosto” – como antanho diziam!
As lavadeiras com melhores posses compravam-na. Não era o caso da humílima mamãe. Por mais barato que fosse a geringonça, seria muito caro para a mamãe. Ela não poderia comprá-la. Aquilo “não era coisa para o nosso bico” – adágio da época! Então, e por ‘não sendo para o nosso bico’, o rosto da Mamãe – eternamente rosado por ser a marca da nossa negral pobreza e do seu interminável sofrimento – era quem pagava o pato.
Jeitoso (Devo dizer: sempre tive tendência para a arte da marcenaria.) e, agora, já com nove anos de idade – e sendo aprendiz em uma marcenaria do Mestre Aristides – tentei e consegui fazer uma geringonça bem mais “moderna” para a mamãe. Estava orgulhoso. O rosado do seu rosto denotava, agora, um ato de incontida alegria!
Epílogo:
Sem precisar pagar passagens, volvo ao presente, e ao presente chego reembarcado nas Asas das Minhas Elucubrações. Noto! A televisão ainda está ligada. A eloquente mensagem publicitária mostra-me o motivo da minha viagem. Era o comercial de um ferro elétrico para passar roupas – anunciado como sendo: um produto de última geração – com todos os modernos avanços tecnológicos. E, de fato, era e ostentava um pomposo nome: Perfect Care Avance! O produto ‘só faltava falar’ e, no que diz respeito à sua missão de passar roupas, era imbatível porque facilitava o trabalho das lavadeiras com uma perfeição digna de aplausos mil e – o que era de melhor – não produzia o calor que tanto corava as faces da minha amada Mamãe.
Ah, Mamãe!... Como gostaria que, agora, você estivesse comigo. Gostaria de estar abraçado com você, ver o seu rosto lindo e rosado pelo franco sorriso e não pelo calor do velho ferro de passar. Queria dar-lhe este presente no Dia das Mães, somente para ver você brincando – como se fosse uma menininha – de passar roupas. Somente brincando, sem a nódoa da necessidade premente de sobrevivência da nossa família. Gostaria de trazer-lhe à mente, mamãe, a lembrança do velho ferro de passar roupas e do Rio Todos os Santos onde você – brava e heroicamente com o seu trabalho – nos educou, nos ensinou a sermos honestos e trabalhadores. Você foi (Santo Deus!... Como dói-me este tempo verbal!) um exemplo de grande, valente, honesta e batalhadora Mãe. Mulher Maravilha por ter sido uma Maravilhosa Mulher.
Para você, idolatrada Mamãe, que, hoje, está lavando e passando, feliz, as roupas do Nosso Deus Pai – desejo-lhe, do fundo do meu saudoso coração – um Feliz dia das Mães, senhora Ana da Cruz Prates, minha inesquecível Mamãe!
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Altamiro Fernandes da Cruz